Léo Moraes perde ação por nomear jornalista fantasma no gabinete dele em Brasília

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O juiz Danilo Augusto Kanthack Paccini, do 4º Juizado especial Cível, julgou improcedente a ação judicial movida pelo deputado federal Léo Moraes (Podemos) contra o advogado Caetano Vendimiatti Netto, que compartilhou, em grupo de WhatsApp,  a informação  sobre decreto nomeando a ex-vereadora Cristiane Lopes para trabalhar no gabinete do parlamentar em Brasília, embora Cristiane, que é jornalista, continuasse a atuar diariamente numa emissora de TV da capital.

A ação de supostos danos morais foi impetrada pelo deputado sob a alegação de que o advogado, que preside uma associação de defesa do consumidor em Rondônia, teria ofendido a honra do parlamentar “com o nítido interesse de enlamear o seu nome perante a comunidade política que integra, situação que lhe gerou danos morais”.

Na sua defesa, Caetano  argumentou  que apenas respondeu uma mensagem, corrigindo o valor da remuneração do cargo indicado. Nega ter disseminado notícia falsa ou ter atuado para atacar a honra de Léo. Afirmou  que Cristiane Lopes foi, de fato, nomeada para exercer cargo no gabinete em Brasília,  exercendo atividade privada em horário de expediente (apresentadora de televisão), conforme noticiado, na época, pelo site Tudorondonia.

Ao julgar a ação improcedente, o juiz Augusto Kanthack Paccini anotou: “O ponto controvertido é a configuração dos alegados danos morais decorrentes da publicação de comentários alegadamente ofensivos em grupo de WhatsApp”.

No caso, de acordo com o magistrado, “restou demonstrado que o requerido (advogado)  participava de grupo de WhatsApp denominado ‘#Amigos do G7’, onde compartilhou a portaria de nomeação da Sra. Cristiane Lopes da Luz Benarrosh no gabinete parlamentar do requerente, juntamente com a informação da remuneração líquida (R$ 3.004,22) e seguido dos seguintes dizeres: Ex-candidata a Prefeitura de Porto Velho Cristiane Lopes agora é fantasma no gabinete do deputado federal Léo Moraes (PODEMOS)”.

Anota ainda o magistrado: “De todo modo, segundo o requerido, a sua manifestação decorreu de matéria jornalística publicada no jornal eletrônico ‘Tudorondônia”, com o seguinte título e subtítulo: Candidata derrotada à Prefeitura de Porto Velho ganha cargo comissionado de quase R$ 7 mil de Léo Moraes em Brasília A remuneração de Cristiane Lopes será de R$ 6.900,00. No entanto, apesar do ato especificar que ela desenvolverá suas atividades no gabinete do parlamentar, que fica em Brasília, a ex-vereadora, que também é jornalista, continua em Porto Velho trabalhando numa emissora de televisão”.

A sentença apresenta, ainda, a seguinte afirmação do magistrado: “O autor é ocupante de cargo público estando, portanto, sujeito a críticas inerentes à exposição da vida pública. A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas”.

CONFIRA A ÍNTEGRA DA DECISÃO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA PODER JUDICIÁRIO Porto Velho – 4º Juizado Especial Cível Processo n. 7016236-81.2021.8.22.0001 AUTOR: LEONARDO BARRETO DE MORAES, RUA PIO XII 1258, – DE 1109 A 1259 – LADO ÍMPAR PEDRINHAS – 76801-498 – PORTO VELHO – RONDÔNIA ADVOGADO DO AUTOR: CASSIO ESTEVES JAQUES VIDAL, OAB nº RO5649 REU: CAETANO VENDIMIATTI NETTO, AVENIDA CALAMA 2300, – ATÉ 2454 – LADO PAR SÃO JOÃO BOSCO – 76803-768 – PORTO VELHO – RONDÔNIA ADVOGADO DO REU: FERNANDO DA SILVA MAIA, OAB nº RO452A Sentença Relatório dispensado, nos termos da Lei. ALEGAÇÕES DO AUTOR: Narra que o réu imputou fato ofensivo à sua honra, com o nítido interesse de enlamear o seu nome perante a comunidade política que integra, situação que lhe gerou danos morais. ALEGAÇÕES DO REQUERIDO: Argumenta que apenas respondeu uma mensagem, corrigindo o valor da remuneração do cargo indicado. Nega ter disseminado notícia falsa ou ter atuado para atacar a honra do autor. Afirma que a Sra. Cristiane Lopes foi, de fato, nomeada para exercer cargo no gabinete do autor, exercendo atividade privada em horário de expediente (apresentadora de televisão), consoante noticiado em site de notícias local. Nega a conduta ilícita e sustenta não ter ultrapassado os limites da liberdade de manifestação. PROVAS E FUNDAMENTAÇÃO: O feito comporta julgamento no estado em que se encontra, eis que a matéria é exclusivamente de direito e documental, sendo que as partes devem instruir regularmente as peças processuais (inicial, contestação e eventualmente a réplica) com todos os documentos indispensáveis ao julgamento da lide e que não podem ser substituídos por testemunhas, razão pela qual não se justifica a designação de audiência de instrução ou dilação probatória. Sendo o magistrado o destinatário das provas e entendendo que o processo está em ordem e “maduro” para julgamento, deve promover a imediata entrega da prestação jurisdicional, medida esta que se impõe no caso em apreço. O ponto controvertido é a configuração dos alegados danos morais decorrentes da publicação de comentários alegadamente ofensivos em grupo de WhatsApp. In casu, restou demonstrado que o requerido participava de grupo de WhatsApp denominado “#Amigos do G7”, onde compartilhou a portaria de nomeação da Sra. Cristiane Lopes da Luz Benarrosh no gabinete parlamentar do requerente, juntamente com a informação da remuneração líquida (R$ 3.004,22) e seguido dos seguintes dizeres: “Ex-candidata a Prefeitura de Porto Velho Cristiane Lopes agora é fantasma no gabinete do deputado federal Léo Moraes (PODEMOS)”. Destaque-se que, em que pesem as alegações da defesa, o print anexado ao id 56495618 evidencia que o requerido encaminhou tais mensagens ao grupo, inexistindo prova de que tenha simplesmente retificado o valor da remuneração. De todo modo, segundo o requerido, a sua manifestação decorreu de matéria jornalística publicada no jornal eletrônico ‘Tudorondônia”, com o seguinte título e subtítulo: Candidata derrotada à Prefeitura de Porto Velho ganha cargo comissionado de quase R$ 7 mil de Léo Moraes em Brasília A remunera- ção de Cristiane Lopes será de R$ 6.900,00. No entanto, apesar do ato especificar que ela desenvolverá suas atividades no gabinete do parlamentar, que fica em Brasília, a ex-vereadora, que também é jornalista, continua em Porto Velho trabalhando numa emissora de televisão (destaque no original) Pois bem. Verifica-se que se está diante de conflito aparente entre direitos fundamentais previstos na Constituição Federal: de um lado, o direito à livre manifestação do pensamento e à informação (art. 5º, IV e XIV, CF) e de outro lado a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, bem como a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (art. 5º, V, CF). Neste caso, necessário ressaltar que os direitos fundamentais não se revestem de caráter absoluto, devendo ser exercidos em conformi- dade com os limites impostos pelo fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, sob pena de praticar-se um ato ilícito (art. 187, CC). Isto dito, à luz das circunstâncias do caso, não vislumbro transgressão ao limite do legítimo exercício da liberdade de expressão. O requerente sustenta que, embora tenha sido nomeada, a Sra. Cristiane Lopes não teria tomado posse em decorrência de pendências documentais. Insurge-se, ademais, quanto à alegação de que se trataria de funcionária fantasma. Entretanto, enquanto a portaria de nomeação é documento público, acessível no site da Câmara dos Deputados (https://www.camara.leg. br/boletimadm/ suplementos/2021/SP170321.pdf) e, inclusive, reproduzido por jornal eletrônico local, a ausência de posse decorrente de pendências documentais é questão administrativa, interna do órgão empregador e, em regra, de conhecimento restrito. Deste modo, não se pode exigir que qualquer cidadão tenha conhecimento de tal fato. Nota-se, ademais, que da portaria não consta qualquer ressalva ou condição para o exercício da função à qual a Sra. Cristiane foi nomeada, tampouco consta dos autos que as partes interessadas tenham esclarecido os eleitores quanto à ausência de posse para o exercício do cargo. Tem-se, por outro lado, a notícia de que o ato de nomeação especificava que as atividades da pessoa nomeada deveriam ser exercidas no gabinete do parlamentar, que fica em Brasília, mas a Sra. Cristiane continuava trabalhando nesta capital. Diante disso, é razoável que o homem médio interprete os fatos como o fez o autor, entendendo pela existência de irregularidade decorrente da incompatibilidade de horário e local de trabalho. Não obstante, o comentário do réu versou sobre suposta ação ilícita eventualmente noticiada e, considerando tratar-se o autor de agente político, cuja atuação sofre regular escrutínio público, parece adequado que os eleitores fossem esclarecidos de que o exercício dos ocupantes dos cargos em comissão de secretariado parlamentar pode se dar tanto em Brasília quanto no Estado de representação do Deputado, nos moldes previstos no art. 2º do Ato da Mesa n. 72/1997 (id 56495622), informação que, acaso prestada, não foi anexada aos autos. É dizer: ainda que ao final a Sra. Cristiane não tenha tomado posse no cargo, o comentário feito corresponde ao exercício do livre direito de manifestação diante das notícias da imprensa local. Sendo o demandante homem público, a sua vida privada, intimidade e imagem sofrem natural mitigação, pois a pessoa eleita para exercer um cargo público, de relevo político e destaque em âmbito federal, como o ocupado pelo requerente, deve suportar críticas e insinuações acima do que há de suportar aquele que não assume tais responsabilidades. A sua atuação parlamentar interessa a toda uma coletividade e está sujeita a críticas por parte da população, que pode inclusive formulá- -las de forma contundente, isso com amparo no direito de livre expressão do pensamento assegurado constitucionalmente. Neste sentido: SUPOSTO CONFLITO ENTRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DIREITO À HONRA. ALEGAÇÃO DE OFENSA À HONRA DE PREFEITO MUNICIPAL. DANOS MORAIS NÃO CARACTERIZADOS. SENTENÇA REFORMADA. Em se tratando de colisão de direitos fundamentais, é cediço que não há respostas definitivas e invariáveis, pois não se trata da dimensão da chamada lógica do tudo ou nada”, que preside o mundo das regras. Neste, a existência de regras opostas, com pretensão de incidência sobre o fato, implica a necessidade de identificar qual a regra válida, afastando-se a outra. O embate entre princípios opostos, como é o caso liberdade de expressão x alegado direito à honra – não encontra solução definitiva e absoluta, devendo ser resolvida pela ponderação, à luz do caso concreto. No caso, trata-se de críticas feitas pelo réu ao Prefeito Municipal através de postagens pelo Facebook. O autor é ocupante de cargo público Prefeito municipal à época estando, portanto, sujeito a críticas inerentes à exposição da vida pública. A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas. É por tal razão que a crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade (Min. Celso de Mello, STF, AI 690.841 AgR/SP). As provas dos autos demonstram que as manifestações não extrapolaram o exercício da liberdade de expressão. Os fatos apontados como irregulares eram todos vinculados ao exercício do cargo do autor, não havendo evidência de que fossem reconhecidamente falsos ou de que houvesse inequívoco animus injuriandi. Danos morais não caracterizados. APELAÇÃO PROVIDA (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul TJ-RS – Apelação Cível: AC 70079965885 RS. Min. Relator Eugênio Facchini Neto, Julg. 27/02/2019). (destaquei) Neste norte, deve-se reconhecer que o réu não ultrapassou os justos limites da opinião crítica admissível a ponto de adentrar o campo do insulto pessoal. O teor das mensagens compartilhadas não transgrediu os limites da liberdade de expressão e o contexto ali posto não se mostra injurioso a ponto de ensejar o direito de reparação moral. Veja-se que a situação não transborda o razoável, tanto que em nenhum momento restou provado pelo autor qualquer constrangimento, transtorno ou embaraço concreto para que fosse reconhecida a lesão moral no caso em apreço, razão pela qual a demanda merece improcedência. DISPOSITIVO: Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial, nos termos da fundamentação supra. Por fim, JULGO EXTINTO O FEITO, COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do art. 487, I, do CPC, devendo o cartório, após o trânsito em julgado desta, arquivar imediatamente o feito, observadas as cautelas e movimentações de praxe. Sem custas e honorários, na forma dos artigos 54 e 55 da Lei 9.099/1995. Caso a parte pretenda recorrer da presente decisão sob o manto da justiça gratuita, deverá comprovar documentalmente que faz jus ao benefício, no ato da interposição do recurso, sob pena de preclusão e indeferimento da gratuidade. Transitada em julgado, arquive-se. Serve a presente como comunicação. Porto Velho, 23 de março de 2022 . Danilo Augusto Kanthack Paccini Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia Avenida Pinheiro Machado, nº 777, Bairro Olaria, CEP 76801-235, Porto Velho.

Fonte: Tudorondonia