Quem quer tirar Dilma está mais sujo do que pau de galinheiro

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Especialistas legislativos contestam perfil dos indicados ou que almejam integrar comissão do impeachment. Muitos têm problemas com Justiça e pouca credibilidade em discussões sobre violência, racismo e homofobia
Especialistas legislativos contestam perfil dos indicados ou que almejam integrar comissão do impeachment. Muitos têm problemas com Justiça e pouca credibilidade em discussões sobre violência, racismo e homofobia

Brasília – Em paralelo à discussão sobre o processo de impeachment de Dilma Rousseff, que está monopolizando o Brasil, e todas as suas repercussões, ganha força – e repercute mal – o perfil dos parlamentares que mais têm se empenhado pelo afastamento da presidenta. O problema é a flagrante contradição das biografias dessa grande maioria. São deputados que figuram como réus em ações penais, já relataram ou defenderam em plenário matérias tidas como prejudiciais para os trabalhadores ou mantêm posturas machistas, homofóbicas e até de apologia à violência. Mas apesar de tudo isso, sentem-se à vontade para contestar a honestidade e dolo da mandatária do país na administração das contas públicas.

“São pessoas que não têm a menor credibilidade para apreciar um pedido de impeachment da presidenta”, afirmou o líder do Psol na Casa, Chico Alencar (RJ), que faz várias críticas ao governo, mas não vê estes colegas com condições de decidir sobre um afastamento de Dilma.

“Por mais que se critique o Eduardo Cunha (presidente da Câmara, que é alvo de um processo de investigação) e se saiba que ele é um dos piores em termos de absurdos cometidos por um parlamentar, temos ciência que Cunha não está sozinho em meio a esse pessoal”, acrescentou Glauber Braga (Rede-RJ) – que é um dos maiores opositores de Cunha – com opinião semelhante à de Alencar.

Dentre os que possuem envolvimento com a Justiça, as estimativas são de que aproximadamente 30 são réus, hoje, em ações penais por crimes de responsabilidade, corrupção, lavagem de dinheiro, crimes eleitorais e contra a Lei de Licitações.

“A Câmara tem 513 deputados. É claro que não se fala de uma forma geral. Temos parlamentares de postura conservadora que possuem uma biografia muito digna e sem máculas. Mas uma coisa é um perfil conservador e respeitoso, outra é o fato de, mesmo não tendo um conduta de desonestidade, o parlamentar se destacar por declarações homofóbicas, racistas ou de incitação à violência”, afirmou o cientista político Alexandre Ramalho, da Universidade de Brasília (UnB). Segundo ele, o que mais espanta é ver estes deputados indicados ou interessados em “comandar os trabalhos de uma comissão tão importante como esta”.

A lista é vasta. Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (SD-SP), é réu em uma ação penal sob acusação de crime contra o Sistema Financeiro Nacional, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Além disso, apesar de presidente licenciado da Força Sindical, Paulinho votou a favor de emenda que autoriza empresas a substituir mão de obra direta por terceirizada em qualquer atividade no projeto que regulamenta a terceirização. Sem falar que apoiou o financiamento eleitoral de campanhas na apreciação da reforma política. “Estou totalmente com o Eduardo (Cunha) e também trabalho pela saída da presidenta”, confirmou ele, que quer um assento na comissão de impeachment.

Alberto Fraga (DEM-DF) que também é réu em ação penal por acusações de propinas em contratos com o Governo do Distrito Federal, ainda por cima é considerado por vários colegas de fazer apologia à violência, pela defesa insistente que fez, nos últimos tempos, da redução da maioridade penal. Foi Fraga quem disse à deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), durante uma votação, que “mulher que gosta de discutir feito homem, também tem que não se importar de apanhar como homem”. A frase lhe rendeu uma representação no Conselho de Ética, que somente foi arquivada recentemente, por intervenção de pessoas do seu grupo, em meio a protestos de vários deputados progressistas

Já Arthur Lira, que preside a comissão mais importante da Casa, a de Constituição e Justiça (CCJ), favorável ao impeachment, está sendo investigado pela Procuradoria-Geral da República por denúncias contra ele e seu pai, o senador Bendito de Lira (PP-AL). O deputado conseguiu a presidência da CCJ depois de ter apoiado Eduardo Cunha na eleição para o comando da Câmara.

Fatos passados

Há neste meio, os que não estão envolvidos em problemas com a Justiça, mas possuem, direta ou indiretamente, ligação com fatos que chamaram a atenção do Congresso – tanto nos últimos meses como no passado.  O líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), é um destes casos.

Mendoncinha, como é mais conhecido, chegou à Câmara no início dos anos 90 e foi autor da emenda da reeleição para cargos executivos, que resultou anos depois na reeleição do então presidente Fernando Henrique Cardoso. O parlamentar, herdeiro do grupo empresarial Moura, também votou a favor do financiamento privado de campanhas e pela redução da maioridade penal. Costuma se posicionar a favor do empresariado, durante votações polêmicas.

Pauderney Avelino (DEM-AM), que já foi do PTB e possui vários mandatos no Congresso, é outro destes. Embora não tenha sido indiciado e as denúncias não tenham sido comprovadas, teve o nome envolvido no esquema de compra de votos para reeleição de FHC.

Neste mesmo grupo está o peemedebista Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA). Ao lado do irmão, o ex-deputado e ex-ministro Geddel Vieira Lima, Lúcio faz oposição cerrada ao Executivo, mas tem, segundo os colegas, histórico de participações em conchavos políticos sérios e de idas e vindas nas adesões e separações com o governo e nas brigas por cargos na Bahia desde o período do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Lula).

Também conhecido no legislativo brasileiro por não figurar numa lista de biografias tão polidas, costuma chamar a atenção o deputado Izalci Lucas (PSDB-DF). Lucas é o representante dos partidos oposicionistas sempre que há uma votação polêmica na Casa. É ele quem organiza grupos de pessoas nas áreas mais carentes do entorno do Distrito Federal para que, mediante pagamentos módicos de um dia ou uma tarde, acompanhados de lanches, lotem ônibus para ir até o Congresso e fazer manifestações nas galerias – que depois são registradas como se tivessem sido realizadas por iniciativa popular. E costuma confirmar isso sempre que questionado pelos jornalistas.

Jair Bolsonaro (PP-RJ) e seu filho, Eduardo Bolsonaro (PP-RJ), foram igualmente lembrados para atuar na comissão do impeachment, provocando perplexidade na base aliada. Os dois dispensam apresentações entre os brasileiros pelas declarações e brigas que estão acostumados a proferir em plenário. Defendem a redução da maioridade penal e a volta do regime militar ao país, sem falar que fazem uma crítica constante ao homossexualismo. O caso mais grave da dupla envolveu o pai: Foi a frase proferida à deputada Maria do Rosário Nunes (PT-RS) de que não a estuprava “porque ela não merecia” – por conta da qual ele está sendo processado.

Manobras regimentais

Há, ainda, os que se destacam pela fidelidade a Eduardo Cunha e por cumprirem as ordens do presidente nas manobras para burlar o regimento interno da Câmara – o que, por tabela, os credencia entre os oposicionistas, a disputarem uma cadeira na comissão do impeachment. Dois deles são os deputados Manoel Júnior (PMDB-PB) e André Moura (PSC-SE), que apresentaram vários requerimentos e questões de ordem no Conselho de Ética contestando o relator do processo contra Cunha. E são considerados “integrantes da tropa de choque” do deputado.

Felipe Bornier (PSD-RJ), por sua vez, faz parte da mesa diretora da Câmara e é um dos principais parceiros do presidente nas aprovações de requerimentos e recursos apresentados, nos casos em que nem Cunha nem o 1º vice-presidente, Waldir Maranhão (PP-AM), podem apreciar.

Os tucanos não ficam atrás nessa relação. Mesmo os que não possuem problemas com a Justiça (uma vez que há deputados e senadores do partido citados ou investigados pela operação Lava Jato, pelo chamado mensalão mineiro e pelo esquema de pagamentos de propinas nos contratos do metrô paulista), terminam chamando a atenção pela repercussão negativa de suas posturas. O deputado Carlos Sampaio, líder da legenda na Câmara (SP), é maior exemplo disso.

Conhecido por um estilo histriônico e por, vez por outra, se envolver em trapalhadas, Sampaio é criticado pelos próprios colegas de sigla e considerado um deputado que tem “interesse desesperado por holofotes”, como afirmou um parlamentar do PSDB. Também é acusado de gostar de gerar factoides. Num desses casos, ele deixou a legenda em maus lençóis quando pediu explicações ao então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, por ter convocado cadeia de rádio e TV para falar da campanha nacional contra o HPV. Carlos Sampaio votou favorável ao financiamento privado de campanhas e à redução da maioridade penal. E faltou às votações do projeto que regulamenta a atividade de terceirização.

“A gente sabe que fazer este tipo de comparação é algo muito complicado hoje. É preciso pegar os parlamentares que declaram apoio ao impeachment um por um e pesquisar a vida, a forma como votam nas questões mais polêmicas, suas condutas e suas relações com a Justiça. Mas a verdade é que o assunto não sai das conversas dos gabinetes e das lideranças porque poucas vezes o Congresso teve tantas contradições e tantos parlamentares criticando uns aos outros. É como na história do roto falando mal do esfarrapado”, avaliou o analista legislativo do Senado Federal, Marcelo Figueiredo Ferreira.

Fonte: Brasil Atual