Mais um falso moralista: Folha disse que Magno Malta recebeu propina e andou de jatinho

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O presidente da Itatiaia e Magno Malta

O presidente da Itatiaia e Magno Malta
O presidente da Itatiaia e Magno Malta
Trocas de e­-mail entre dirigentes de uma das maiores fabricantes de móveis de cozinha
do país trazem indícios de repasse não declarado de R$ 100 mil para o senador Magno
Malta (PR­ES).

Os e­-mails, obtidos pela Folha, são de 8 de setembro de 2014.
Outras mensagens entre funcionários e a direção da Cozinhas Itatiaia indicam que Malta
viajou no avião particular da empresa em 2012 e 2013.
Malta, da bancada evangélica no Senado, nega ter recebido dinheiro da Itatiaia e afirma
que voou no avião da firma para fazer palestras.
Os e­-mails são conversas das quais participam o presidente da Itatiaia, Victor Penna
Costa, o filho dele, Daniel Costa –que era gerente financeiro à época– e o então assessor
da firma Hugo Gabrich.

Em um deles, o presidente da empresa diz que precisa pagar R$ 400 mil para
“consultoria” de Gabrich. O assessor responde: “Estou entregando a NF [nota fiscal] que
cobre o montante de R$ 500 mil conforme orientação do dr. Victor. Impostos serão
incluídos na NF, totalizando R$ 575 mil.”
Na nota emitida pela Vix Consulting, de Gabrich, a contratante é a Itatiaia. O acerto
mostra que a contratante pagou os R$ 75 mil de impostos para a Vix –o que sugere que
a nota foi encomendada.

Na sequência dos e-­mails, Costa manda o filho depositar para a Vix Consulting somente
R$ 475 mil. “Os outros 100.000 são para compensar a retirada em dinheiro de R$
100.000 do Malta. Não sei como foi contabilizado [a saída desse valor da empresa]”,
escreve o presidente da firma.
O filho dele, então, pergunta: “Quem realizou o pagamento do Malta? Existe NF, foi
declarado a doação?”.
Victor encerra: “Não existe NF, não declaramos. Está em aberto, talvez como
adiantamento para mim. Veja com Lailton [tesoureiro da empresa]. Favor apagar todos
os e­-mails sobre este assunto”.

Procurado, Gabrich afirmou que a empresa fez nota fria para justificar pagamentos não
declarados da Itatiaia.

O destino do restante do valor da nota (R$ 400 mil) não aparece na troca de e­-mails.
A pedido da reportagem, as origens das mensagens foram analisadas pelo perito em
ciências forenses Reginaldo Tirotti. O especialista atestou a autenticidade delas,
identificando a sequência de códigos gerados pelos remetentes das mensagens.
A Itatiaia foi fundada em 1964 e tem duas fábricas, em Ubá (MG) e em Sooretama (ES).
Em outro e­mail, de 8 de julho de 2014, um ano após a Itatiaia inaugurar a unidade
capixaba, que recebeu incentivos fiscais, Gabrich descreve a Victor Costa o cenário
político no Espírito Santo.

Menciona candidatos “viáveis” ao governo, fala de Malta, que “fechou aliança com o
governador Casagrande”, da mulher dele, Lauriete, que “não disputará a reeleição para
deputada federal”, e do “nosso deputado estadual, o Marcelo Santos ­ PMDB”.
“Não tenho dinheiro para todos”, responde o presidente da Itatiaia. “Não posso dar mais
para deputado estadual que para senador.”
Gabrich diz: “O Magno não é candidato agora a nada.”

A Folha obteve também uma troca de mensagens entre Gabrich e Malta, que usa seu email
pessoal. Gabrich fala dos R$ 100 mil da Itatiaia e o senador responde: “Amigo não
tenho conhecimento de nada dessas coisas.. Mas dia 16 estarei de volta a Brasília [sic]”.
O ex­-assessor da Itatiaia envia, então, cópia de conversas da direção da empresa que
citam o político, que rebate: “Somos amigo Hugo.. Sempre fomos. Dia 16 te espero para
o almoço no gabinete kkkk a rabada lembra?? [sic]”.

JATINHO
Outros e­-mails mostram que o senador usou avião particular da Itatiaia ao menos duas
vezes: em 20 de julho de 2012, de Vitória a Aracaju (SE), e em 27 de fevereiro de 2013,
no trajeto Brasília­-Rio.

Em 22 de fevereiro daquele ano, uma secretária da Itatiaia agenda um voo para Costa,
Gabrich e o senador. Em 28 de fevereiro, Malta vai com Gabrich ao BNDES –a reunião
não constou da agenda oficial, informou o banco.

Sobre a viagem a Aracaju, há um e­-mail enviado ao presidente da Itatiaia pelo então
diretor Beto Rigoni, que relata problemas no trajeto.
“Eram 7 pessoas quando só cabem 4 no avião. O Yunes [piloto] tinha duas opções: dar
duas viagens ou colocava todos dentro na aeronave. Como o senador pressionou ele
bastante, ele […] seguiu para Aracaju em 8 pessoas dentro do avião (além da
insegurança, fizeram uma ‘festa no ar’).”
“Nós precisamos começar a cortá­-lo. Os acionistas também não querem tanta
proximidade”, responde Costa.

MENSAGENS SUGEREM FRAUDE EM LEILÃO TRABALHISTA

Mensagens de dirigentes da Itatiaia dão indícios de que o presidente da empresa, Victor
Penna Costa, fraudou a arrematação de um terreno em Belo Horizonte lesando centenas
de trabalhadores que cobravam dívidas trabalhistas de uma outra empresa.
Costa, por meio de seu assessor, Hugo Gabrich, arrematou a área de 12.369 metros
quadrados, em 2010, pelo valor mínimo estipulado pela Justiça, R$ 1,56 milhão.
O terreno pertencia à SIT Engenharia S.A., uma das empresas que construiu Brasília, e
foi a leilão por causa de ação trabalhista. Seu valor de mercado era R$ 25 milhões.
Em e-­mail de 2013, quase três anos após o leilão, o dono da SIT, Luiz Lima Lobato,
escreve ao presidente da Itatiaia cobrando quantia que ambos teriam acertado por fora.
Com isso, Lobato embolsaria os valores, em vez de pagar trabalhadores.
Lobato anexa ao e-­mail cópia de um acordo de gaveta que previa que Costa lhe pagaria
por fora quase R$ 3,9 milhões. Também se queixava que Costa arrematou o imóvel por
preço abaixo do que tinham combinado –deveria ter sido R$ 2,6 milhões, diz. Ex-trabalhadores
da SIT estão sem receber até hoje.

A Folha teve acesso a supostos pagamentos desse acordo: um e­-mail, de 2012, em que
Costa autoriza transferência de R$ 300 mil a uma conta de Lobato; e a cópia de um
cheque da Itatiaia, de R$ 300 mil, em nome de Lobato.

Costa ganhou o leilão com o lance mínimo porque não houve interessados. A área estava
hipotecada, o que pode tê­-los afastado. Após o leilão, cancelou­-se a hipoteca.
A arrematação é questionada na Justiça do Trabalho. A causa que o levou a leilão é fruto
de um processo trabalhista contra a SIT, mas outro credor diz que tinha preferência na
arrematação.

O caso está no Tribunal Superior do Trabalho, que marcou julgamento para quarta (17).
Gabrich, hoje ex­assessor de Costa, peticionou ao ministro do TST Caputo Bastos
avisando sobre a fraude.
Em março deste ano, Costa escreveu a seu ex­-assessor: “Ganhei no TST rsrsrs já
acostumei com a situação”. O despacho ao qual ele se referia, porém, só foi publicado
três dias depois.

OUTRO LADO
Em nota, o senador Magno Malta negou ter recebido dinheiro da Cozinhas Itatiaia.
“O senador, que vive grande exposição em virtude do processo de afastamento da
presidente Dilma Rousseff, responde com transparência e com a consciência de não ter
cometido nenhum crime.”
Os voos no jatinho, “que não são nenhuma ilegalidade”, foram para palestras sobre “o
combate à pedofilia, , a redução da maioridade penal e a luta contra a legalização do uso da maconha.

A reunião no BNDES com funcionário da Itatiaia e o ex­-diretor do banco Guilherme de
Lacerda foi para atrair empregos para seu Estado.
Victor Costa, presidente da Itatiaia, não respondeu.

Questionado sobre o e­-mail ao presidente da Itatiaia, o empresário Luiz Lobato
reconheceu o texto. Disse, porém, que não se lembra de ter recebido por fora porque o
caso já tem seis anos. Victor Costa não respondeu. O TST não se manifestou.

Reinaldo Turollo Júnior
Da Folha de S. Paulo