Depoente esvazia tese de que Dilma tenha cometido crime de responsabilidade

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COMISSÃO_DO_GOLPE757764_84a5fccfd8_bA primeira testemunha ouvida hoje pela Comissão Especial do Impeachment no Senado, o ex-secretário adjunto da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) do Ministério do Planejamento, Cilair Rodrigues de Abreu, esvaziou a tese de que Dilma Rousseff teria cometido crime de responsabilidade ao assinar decretos de suplementação orçamentária em 2015, como tenta fazer crer a acusação. Cilair mostrou que é longo o caminho entre o pedido de mais recursos para determinado ministério até ser transformado num decreto.
Os controles envolvidos e a definição se o pedido deve ser por um decreto ou por um projeto de lei, fazendo tal solicitação, são estabelecidos por um sistema computadorizado.
Por exemplo: o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) solicitou mais recursos ao Ministério da Justiça, ao qual é ligado. Só que a área de controle do CNJ seguiu orientações de portarias e da Lei de Responsabilidade Fiscal. Esse pedido, então, chega à Secretaria de Orçamento Federal (SOF) e é lá que se faz um check list se tudo está de acordo com o que manda a legislação e as leis orçamentárias.
A partir daí o sistema parametriza, ou seja, compara se existe a possibilidade de o recurso orçamentário seguir para a devida fonte de despesa. As áreas jurídicas dos Ministérios que fazem a solicitação aprovam e, antes de ir para a SOF, ainda, é o responsável, o ministro da pasta, quem põe sua assinatura no pedido. Quando o decreto é definido, ainda passa pela área jurídica da Casa Civil. Só depois desse périplo a presidenta Dilma ou qualquer outro presidente assina o decreto.
Foi assim que aconteceu, ao contrário do que imagina ou pensa, maliciosamente, os advogados da acusação contra Dilma. Numa análise rasteira, seria como dizer que assim que acordasse, a presidenta Dilma diria para seus botões que hoje iria baixar 10, 15 decretos de suplementação orçamentária. Não é assim e isso ficou claro, inclusive quando Cilair disse com todas as letras que nenhum decreto assinado por Dilma feriu a meta fiscal e, logo, a Lei de Responsabilidade Fiscal. Em outras palavras, não houve crime.
Tempo
Nesta quarta-feira (15), a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) reclamou do tempo destinado às respostas da testemunha, de apenas três minutos. Como o assunto é muito técnico, nem todos os brasileiros conseguem entender que há uma conspiração em torno desses decretos como se Dilma, para ser afastada, teria mesmo cometido crime de responsabilidade por ter assinado tais decretos.
“Em 2009 o Congresso aprovou medida reconhecendo créditos assinados antes da mudança da meta fiscal. Essa decisão tiraria do Tribunal de Contas da União qualquer autonomia para ter entendimento diferente em relação a 2015”, observou a senadora.
Ela quis saber de Cilair se a Secretaria de Orçamento Federal teria autonomia para analisar o crédito solicitado por outro poder. Segundo ele, a SOF tem autonomia para fazer análise de todos os pedidos, até porque todos os diretores são servidores públicos, existem 15 gerentes e todos os entendimentos estão vinculados às leis orçamentárias. Nada, em suma, é feito de maneira aleatória.
“Há portarias que determinam os procedimentos para definir onde cortar e onde realocar os recursos”, disse Cilair, acrescentando que, objetivamente, quando o documento vai para a assinatura da presidenta, na forma de decreto, já segue na forma de ato próprio.
Após explicação, a senadora Gleisi colocou o TCU em dúvida porque, ao invés de atribuir a responsabilidade à presidenta Dilma pelos decretos, deveria antes, como órgão auxiliar do Congresso, questionar o ato de emissão de crédito. “O TCU pediu credito emitido como decreto nas mesmas condições do que se atribui um crime de responsabilidade. Não há um ato por vontade própria de suplementação de crédito orçamentário”, disse ela.
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) perguntou a Cilair se ele havia recebido alertas para eventual desrespeito à meta fiscal do TCU e sua resposta foi negativa. “Nunca tinha ouvido essa interpretação de incompatibilidade dos atos”, afirmou o ex-secretário adjunto.
Farsa
Por mais que senadores como Ricardo Ferraço (PSDB-ES), Simone Tebet (PMDB-MS), Magno Malta (PR-ES), José Medeiros (PP-MT) e Ana Amélia (PP-RS) fiquem incomodados com a palavra golpe, porque tentam mostrar para a opinião pública uma atitude – esforçadíssima – de que estão ali para mostrar que houve crime de responsabilidade de Dilma, a senadora Fátima Bezerra (PT-RN) botou um dedo na ferida. Ela mostrou que foi Eduardo Cunha, sócio majoritário do golpe, que fez articulações para que a Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2015 tivesse atraso em sua votação.
“Ele, que foi alçado como herói nacional, tem sua digital no processo de impeachment por desvio de finalidade. Ontem, o capitão do golpe, depois de ter feito o trabalho sujo, agora começa a ser abandonado pelo governo golpista”, disse Fátima.
Segundo a senadora, o processo contra Dilma é formado por teses estapafúrdias porque os interesses reais não são confessados, pois o plano era acabar com a Lava Jato – ou para “estancar a sangria”, como confessou o senador Romero Jucá (PMDB-RR) quando flagrado numa conversa nada republicana com o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado.
“Portanto, a sociedade não vai permitir e percebe que não tem nada a ver com o combate à corrupção. A sociedade não vai engolir motivos que levam ao impeachment, porque também percebe as faces nefastas da política brasileira de um grupo político que jamais teria voto se fosse submetido pelas urnas, dado o tamanho da retirada dos direitos sociais”, enfatizou. “A verdade dói”, completou.
Audiência Esclarecedora
O senador Humberto Costa (PT-PE) considerou que a apresentação e as respostas dadas pelo ex-secretário da SOF, Cilair Rodrigues de Abreu, foram as mais relevantes ouvidas até agora desde o início da comissão do impeachment. Ele lamentou que boa parte dos representantes da base do governo provisório de Michel Temer não estivesse presente, confirmando que existe uma pressa incontida para que os trabalhos sejam antecipados.
“É exatamente o oposto daquilo que a oposição nos acusa de querer protelar. Há uma pressa incompreensível da base do governo interino para tirar Dilma. Na verdade, estão perdendo a oportunidade de ver a fragilidade dos pretextos usados para afastá-la. Cilair foi transparente em demonstrar que não houve crime. Na prática, não há ato da presidenta Dilma”, salientou Humberto.
O senador destacou que nem no Plano Safra e muito menos nos decretos de suplementação orçamentária se apurou irregularidades. “O próprio relator da comissão reduziu a quatro decretos que poderiam ter influenciado a meta fiscal e questionados. Entendo que saímos tranquilos daqui porque não houve qualquer dolo, ação criminosa, até porque ficou claro que a solicitação de crédito passa por vários órgãos e vários poderes”, afirmou.
Erro crasso
A senadora Regina Souza também criticou os senadores apoiadores do presidente provisório Michel Temer que se sentem ofendidos quando se fala que há um golpe parlamentar em curso, baseado numa denúncia fabricada sob medida e aceita, por vingança, pelo deputado afastado Eduardo Cunha.
“Recentemente, o Congresso aprovou nova meta orçamentária com déficit de R$ 170 bilhões, ante uma meta de R$ 96 bilhões, sem apontar as despesas. Já pensou se fosse Dilma que fizesse isso. Seria motivo de manchetes dos jornais”, disse ela.
Como os senadores que apoiam Temer ficam incomodados com a palavra golpe, Regina Souza lembrou que um deputado promovia encontros noturnos para articular a forma de tirar Dilma do poder, porque ela sempre apoiou as investigações da Lava Jato, doa a quem doer. “Como não gostam da palavra golpe, vou usar então a palavra conspiração”, assinalou.
Marcello Antunes