RK: “O DIA EM QUE EU DETONEI O GOVERNO DO DF”

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Durval Barbosa diz que se aproximou de promotora e procurador após ajudá-los a retirar uma nota do Blog do Kuppê

 

Durval Barbosa diz que se aproximou de promotora e procurador após ajudá-los a retirar uma nota do Blog do Kuppê
Durval Barbosa diz que se aproximou de promotora e procurador após ajudá-los a retirar uma nota do Blog do Kuppê

O jornalista Roberto Kuppê  já esteve no olho do furacão, das denúncias do maior escândalo de corrupção já verificado no  Governo do Distrito Federal (GDF). Graças a um e-mail que ele recebeu anonimamente em março  de 2007, foi desencadeada uma operação (Caixa de Pandora) que desarticulou a maior quadrilha de corruptos da história do Planalto Central, que culminou com a prisão de José Roberto Arruda (governador na época). Ao receber o email, Roberto Kuppê, sem entender direito o seu conteúdo, o publicou no blog dele. Durante os dias em que se sucederam a publicação do conteúdo do email denominado “O MP contaminado”, nada aconteceu. Foi somente após o jornalista ter ganhado o prêmio da Mega Sena que recebeu um telefonema do senador Valdir Raupp (PMDB-RO). O senador pedia que RK tirasse do do blog uma matéria que estaria prejudicando alguns amigos dele. Roberto Kuppê não entendeu a gravidade do pedido, pois estava em meio à euforia da vida nova que seguia após ficar milionário. O senador ligou duas vezes. Na segunda, RK procurou a matéria para tirar do ar, mas ela não estava mais lá. Alguém tinha tirado. Como alguém tirou uma matéria do site do qual só ele tinha a senha? Leia a seguir o que aconteceu.

 

Como jornalista, Roberto Kuppê não é um dos nomes mais conhecidos do cenário da mídia em Brasília. Durante anos, ele foi assessor de políticos de Rondônia na capital. Hoje, mantém um blog, o Blog do Kuppê. Mas, na verdade, Roberto Kuppê é mais conhecido por ter ganho quase R$ 19 milhões na Mega-Sena há dois anos. Hoje, ele administra a sua fortuna como empresário e toca seu blog. Kuppê, porém, está no centro das denúncias que agora atingem o procurador-geral da República do Distrito Federal e Territórios, Leonardo Bandarra. Foi por conta de uma nota que o milionário da Mega-Sena publicou que a promotora de Justiça do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) Deborah Guerner se aproximou do ex-secretário de Assuntos Institucionais do GDF Durval Barbosa. E levou com ela, conforme Durval acusa, o procurador Bandarra.

A história é contada em detalhes no relatório da Corregedoria-Geral do MPDFT, ao qual o Congresso em Foco teve acesso na íntegra e cujo conteúdo agora publica, em três capítulos. No primeiro capítulo, revelou-se que Bandarra é acusado de ter vazado para Durval a minuta do mandado de busca e apreensão da Operação Megabyte. Com isso, Durval, que era o alvo principal, pôde desaparecer com documentos que o comprometiam e safar-se da operação. O segundo capítulo começa agora.

A nota publicada por Roberto Kuppê era intitulada “MP contaminado”.  Kuppê dizia que Leonardo Bandarra, Deborah Guerner e seu marido, Jorge Guerner, estariam envolvidos com irregularidades em contratos para prestação de serviços de coleta de lixo no Distrito Federal. De acordo com Durval, em depoimento prestado ao Ministério Público do DF no dia 9 de dezembro do ano passado, no final de 2007, ele foi procurado por uma assessora do governador José Roberto Arruda, de nome Cláudia Marques. Ela agiu então como intermediária do casal Deborah e Jorge Guerner. Como Durval tinha, desde a época em que era presidente da Companhia de Desenvolvimento do Planalto (Codeplan) no governo Joaquim Roriz, contatos com pessoas do ramo da informática, o casal queria saber se ele tinha como tirar do ar a nota de Kuppê e todos os seus desdobramentos pela internet. Àquela altura, diziam eles, a nota já seria motivo de comentários de leitores dos blogs dos jornalistas Reinaldo Azevedo e Diogo Mainardi, da revista Veja.

Naquele momento, Bandarra buscava ser reconduzido ao cargo de procurador-geral da República do DF e Territórios. Segundo o depoimento de Durval, a nota podia prejudicar os planos de Bandarra. Segundo lhe diziam Cláudia Marques e Deborah Guerner, o então procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, teria orientado Bandarra a “retirar das páginas de vários sites aquela notícia negativa”. Do contrário, ele não poderia reconduzi-lo ao cargo principal do MPDFT. Se Durval conseguisse fazer o que o casal Guerner lhe pedia, “seria recompensado posteriormente com os favores do Ministério Público, recebendo ajuda nos processos”.

O que se deu em seguida parece ter sido uma eficiente ação de hackers contra as páginas nas quais a tal nota estava incluída. Durval alegou não ter “conhecimentos técnicos” para tal tarefa. Procurou um amigo, de nome Renato Martins Júnior, que entrou em contato com outro amigo, “da área de segurança da informação”, e, ao cabo de 20 dias, eles deram sumiço à nota de Kuppê.

“Nenhuma dúvida existe de que Durval Barbosa providenciou a retirada de sites da internet da matéria ‘MP contaminado’, veiculada no blog de Roberto Kuppê”, conclui o relatório da Corregedoria-Geral do MPDFT, assinado pela corregedora-geral,  Lenir de Azevedo. A nota, diz a corregedora, de fato desapareceu, e Leonardo Bandarra foi reconduzido ao cargo de procurador-geral do MPDFT no dia 3 de julho de 2008. De acordo com o que é narrado no texto da corregedoria, os hackers conseguiram encontrar menções à nota no blog de Reinaldo Azevedo. “Não foi encontrado nada no de Diogo Mainardi”.

A primeira providência foi retirar, então, da seção de comentários e do blog do Kuppê as referências à nota. Os dois passaram a digitar, então, “Leonardo Bandarra” no site de buscas Google. Encontraram ali a tal nota. O técnico explicou que aquilo “era a memória do Google”, a nota original não existia mais.

O técnico iniciou, então, um segundo trabalho, para retirar do Google a referência ao que chamava de “links quebrados”. Após um tempo, “a pesquisa com o nome Leonardo Bandarra não mais retornava o resultado do link das notícias do blog”.

“Relacionamento promíscuo”

“A partir desse ‘favor’, começou a haver estreito e promíscuo relacionamento pessoal entre a promotora de Justiça Deborah Guerner e o então secretário de Assuntos Institucionais, Durval Barbosa, que já se encontrava respondendo a inúmeros procedimentos criminais e de improbidade administrativa, fato este de pleno conhecimento deste MPDFT”, escreve a corregedora Lenir de Azevedo.

Encontros e reuniões aconteciam sempre na “igreja”, o codinome dado à casa de Deborah no Lago Sul. Foi ali que, com o sucesso da operação, Deborah entregou a Durval a cópia da minuta do mandado de busca e apreensão e recebeu, segundo acusa o ex-secretário, R$ 1,6 milhão, para ela e Bandarra, acondicionados em caixas de papelão embrulhadas com papel de presente.

 

Outro lado

Procurado pelo Congresso em Foco, o procurador-geral do Distrito Federal e Territórios, Leonardo Bandarra, disse, a partir da sua assessoria, que nada pode comentar sobre o relatório da Corregedoria porque não teve acesso a ele. Bandarra estranhou que a imprensa tenha obtido cópia do relatório, que é sigiloso. “Somente quando ele tomar conhecimento do inteiro teor do relatório é que poderá se pronunciar”, informou a assessoria.

Sobre as denúncias de Durval, porém, de um modo geral, Bandarra se declara inocente. “Ele não sabe por que Durval resolveu falar essas coisas, mas desconfia que seja retaliação pelas várias ações que foram movidas contra ele pelo Ministério Público a partir do seu empenho e esforço pessoal”, diz a assessoria. Meses depois de tudo isso, o governador do DF, José Roberto Arruda foi preso. Caiu toda a cúpula do GDF. Tudo, graças a um e-mail apócrifo recebido e publicado por Roberto Kuppê. Anos após RK descobriria quem mandara o e-mail. Fora o próprio Durvall Barbosa, o mesmo que “providencialmente” mandou um hacker retirar de forma fraudulenta. RK ficou sabendo disso no Rio de Janeiro, durante um depoimento a um Juiz Federal do MPF.
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