Morre ex-deputado Caó autor de lei que tornou discriminação racial crime

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Antonio Neto, vice-presidente do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial (CEPIR) de Rondônia, com Carlos Alberto Caó em um evento
O ex-deputado federal Carlos Alberto Caó de Oliveira morreu neste domingo (4), no Rio de Janeiro, aos 76 anos. Caó era baiano, jornalista e advogado. Ele também foi um dos grandes militantes do movimento negro brasileiro, na luta contra o racismo.

 

Em Porto Velho,  Antonio Neto, vice-presidente do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial (CEPIR) de Rondônia, lamentou a morte do ativista. “É com muita tristeza que venho informar o falecimento neste domingo do companheiro de luta Carlos Alberto de Oliveira (Caó), 76 anos, na foto comigo na sede do PDT no RJ no ano de 2012. Carlos Alberto Oliveira, o Caó – que foi um grande batalhador pela igualdade racial no Brasil –, já em 1985 criava a Lei 7.437/85, que incluía entre as contravenções penais a prática de atos resultantes de preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil; dando nova redação à Lei número 1.390, de 3 de julho de 1951, conhecida por Lei Afonso Arinos. Mas o racismo só foi elevado à categoria de crime na Constituição Federal de 1988, em que a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível”, disse Antônio Neto.

É de autoria de Carlos Alberto a Lei número 7.716 de 5 de janeiro de 1989 (que será lembrada no próximo dia 26), promulgada pelo presidente José Sarney, que possui o intuito de dar aplicabilidade à legislação brasileira, e definir os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. A legislação define como crime o ato de praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Também regulamentou o trecho da Constituição Federal que torna inafiançável e imprescritível o crime de racismo, após dizer que todos são iguais sem discriminação de qualquer natureza. Vá em paz companheiro você deixou aqui o seu legado!

Caó foi o autor da lei que tornou a discriminação racial um crime, em 1989.
Biografia
Carlos Alberto Caó Oliveira dos Santos – assim registrado no início da década de 80, por razões de identificação política, em substituição ao nome de batismo, Carlos Alberto Oliveira dos Santos – nasceu em Salvador no dia 24 de novembro de 1941. Era filho de Temístocles Oliveira dos Santos e de Martinha Oliveira dos Santos.
Sua trajetória política foi iniciada aos 15 anos, quando virou secretário da Associação de Moradores do bairro da Federação, cargo que exerceu de 1956 a 1959. Atuando também no movimento estudantil, de 1958 a 1959 foi vice-presidente do Centro Acadêmico Rui Barbosa, do Colégio Estadual da Bahia. Em 1960, ingressou na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (FDUfba) e, em 1962, foi eleito vice-presidente de intercâmbio internacional da União Nacional dos Estudantes (UNE).
Perseguido durante o regime militar, refugiou-se no Rio de Janeiro, onde passou a exercer a profissão de jornalista. Foi redator e editor político no jornal Luta Democrática até 1966 e trabalhou na Tribuna da Imprensa até 1968.
A partir deste ano, ainda no Rio, trabalhou em O Jornal e na TV Tupi, também como redator e editor político. Foi um dos fundadores e primeiro secretário-geral do Clube dos Repórteres Políticos, entidade criada para enfrentar a censura imposta pela ditadura militar.
Em 1970, foi submetido a julgamento na 6ª Região Militar, em Salvador, sendo condenado a dois anos de prisão. Permaneceu preso na cidade por seis meses, tendo sido libertado por decisão do Superior Tribunal Militar (STM), que considerou a pena prescrita.
Trabalhou ainda no Jornal do Brasil e, em 1974, na revista Veja. Envolvido com a atividade sindical, em julho de 1978 elegeu-se presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio, sendo reeleito em 1981, ano em que, a convite de Leonel Brizola, filiou-se ao Partido Democrático Trabalhista (PDT).
Nas eleições de 1982 obteve a segunda suplência do PDT na Câmara dos Deputados e assumiu o mandato em 1983, licenciando-se, no mesmo mês, para exercer o cargo de secretário de Trabalho e Habitação do primeiro governo Brizola no Rio de Janeiro (1983-1987). À frente da pasta, foi responsável pela implementação do programa Cada família, um lote — uma política habitacional alternativa à do Banco Nacional de Habitação (BNH) e dirigida às classes menos favorecidas — e pela instalação de um plano inclinado em favelas cariocas. Permaneceu no cargo até 1986, quando foi novamente suplente na eleição para deputado federal constituinte. Ainda em 1986, passou a integrar o diretório nacional do PDT.
Retornou à Câmara em janeiro de 1987, antes do início dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, em virtude da morte do deputado Giulio Caruso. Empossado como constituinte em 1988, foi um dos poucos parlamentares negros a participar da elaboração da nova Constituição, consagrando-se pela aprovação da emenda Caó, posteriormente regulamentada pela Lei Caó, que tornou a prática do racismo crime sujeito à prisão. Além desta, conseguiu incorporar cerca de 60 emendas à nova Carta Magna.
Em 1994, Caó candidatou-se ao Senado. Mesmo com 700 mil votos, foi derrotado. Em 1998 e 2002, voltou a se candidatar à Câmara dos Deputados, mas novamente sem sucesso. Viúvo, ele tinha dois filhos. Com informações da Fundação Getúlio Vargas.
LEI CAÓ

Lei CAÓ (Carlos Alberto de Oliveira Caó) – 1985

LEI Nº 7.437, de 20 de dezembro de 1985, que inclui, entre as contravenções penais, a prática de atos resultantes de preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil, dando nova redação à Lei nº 1.390, de 3 de julho de 1951 – Lei Afonso Arinos.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Constitui contravenção, punida nos termos desta Lei, a prática de atos resultantes de preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Art. 2º Será considerado agente de contravenção o diretor, gerente ou empregado do estabelecimento que incidir na prática referida no art. 1º desta Lei.

DAS CONTRAVENÇÕES

Art. 3º Recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem ou estabelecimento de mesma finalidade, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Pena – prisão simples, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa de 3 (três) a 10 (dez) vezes o maior valor de referência (MVR).

Art. 4º Recusar a venda de mercadoria em lojas de qualquer gênero ou o atendimento de clientes em restaurantes, bares, confeitarias ou locais semelhantes, abertos ao público, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, e multa de 1 (uma) a 3 (três) vezes o maior valor de referência (MVR).

Art. 5º Recusar a entrada de alguém em estabelecimento público, de diversões ou de esporte, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, e multa de 1 (uma) a 3 (três) vezes o maior valor de referência (MVR).

Art. 6º Recusar a entrada de alguém em qualquer tipo de estabelecimento comercial ou de prestação de serviço, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, e multa de 1 (uma) a 3 (três) vezes o maior valor de referência (MVR).

Art. 7º Recusar a inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Pena – prisão simples, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa de 1 (uma) a 3 (três) vezes o maior valor de referência (MVR).

Parágrafo único – Se se tratar de estabelecimento oficial de ensino, a pena será a perda do cargo para o agente, desde que apurada em inquérito regular.

Art. 8º Obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público civil ou militar, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Pena – perda do cargo, depois de apurada a responsabilidade em inquérito regular, para o funcionário dirigente da repartição de que dependa a inscrição no concurso de habilitação dos candidatos.

Art. 9º Negar emprego ou trabalho a alguém em autarquia, sociedade de economia mista, empresa concessionária de serviço público ou empresa privada, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.

Pena – prisão simples, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa de 1 (uma) a 3 (três) vezes o maior valor de referência (MVR), no caso de empresa privada; perda do cargo para o responsável pela recusa, no caso de autarquia, sociedade de economia mista e empresa concessionária de serviço público.

Art. 10 Nos casos de reincidência havidos em estabelecimentos particulares, poderá o juiz determinar a pena adicional de suspensão do funcionamento, por prazo não superior a 3 (três) meses.

Art. 11 Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 12 Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, em 20 de dezembro de 1985; 164º da Independência e 97º da República.

José Sarney

Fernando Lyra